Após um sonho em que classifica como tenebroso, Alexandre Santana ouviu o sub consciente e reuniu, em mais de 500 paginas, o resultado de uma soma curiosa: o terror em pinceladas com a ficção e não ficção. Inspirado em uma lenda (ou não), “A Foice” tornou-se uma obra amada por um publico que, ávido por terror, declara sua paixão por um dos gêneros mais contraditórios da arte mundial.

Nesta entrevista com nosso editor Occello Oliver, Alexandre conta suas ideias e desenvolvimento de um trabalho primoroso, um dos campeões de vendas de 2020 da Cultura em Letras.

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Alexandre, você estréia na Cultura em Letras com uma obra de peso, um livro de terror. Como surgiu “A foice”?

Pergunta legal essa. A Foice derivou de um sonho que tive anos atrás e me deixou bem assustado, mas percebi que aquilo poderia render um livro. Então criei toda uma história de como chegar até a passagem ocorrida no sonho, que inclusive está no livro, e segui com a narrativa até o final. Quando achei que havia concluído, tive um outro sonho que seria a continuação do anterior e tive que incluir mais um capítulo no texto original.

São mais de 500 páginas de mistério, suspense e passagens macabras na estória. Teve receios em desenvolver o trabalho?

Nem um pouco. Meu maior receio foi criar uma narrativa frouxa, que não prendesse nem assustasse o leitor. Espero que ter conseguido, porque me dediquei um bocado.

“A foice” é baseado em fatos reais, ao ocorrido em Cipestral (SP) há alguns anos. Como fez a pesquisa?

Na verdade, o livro foi uma amalgama de um sonho, um crime bárbaro ocorrido em Recife muitos anos atrás e alguns outros casos da história policial do Brasil que pesquisei. Também tive que estudar tanatologia e pratica forense. Já a cidade de Ciprestal… essa é uma lenda. Eu tenteei ambientar o livro em Recife, e até consegui descrever bem a cidade, mas preferi omitir nomes e criar outros justamente para não dar provas de que minha história é uma narrativa fictícia. Stephen King usa muito esse recurso, como Howard Lovecraft usou bastante também antes dele.

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Seu público é formado pela faixa jovem, de acordo com o perfil de vendas da editora. Fez o livro pensando nos jovens?

Na verdade, fiz o livro pensando em fãs de terror de uma maneira geral, inclusive imaginava que os mais jovens não iriam gostar muito. Os protagonistas do livro são homens já adultos, chegando à meia idade, enfrentando realidades e conflitos adultos, cheios de amargura. Creio que foi mais uma obra do acaso, à qual sou muito grato, ou inconscientemente transmiti ali alguma coisa que me ligou aos jovens.

O livro é o segundo mais vendido da editora em 2020, com a primeira tiragem caminhando para o fim. Leitores lhe procuraram?

Até agora, não. Talvez toda a amargura do texto os tenha cansado ahahahahaha

Imaginava ser sucesso com seu trabalho?

Pergunta difícil essa. Acho que nem pensei nisso quando decidi publicar A Foice. Fiz isso mais porque devia a mim mesmo cumprir a tarefa. Tive um sonho para lá de tenebroso, fui marcado por aquilo, precisava contar aquela história a quem desejasse ler e fui em frente. Se alguém, em algum lugar, chegar para um amigo e disser “putz, acabei de ler esse livro, A Foice, um livro de terror das trevas, toma aqui emprestado que eu sei que você vai curtir” eu já vou me sentir satisfeito.

O que te inspira a escrever? Pretende focar apenas no terror?

Então… terror é, talvez, o que eu consiga escrever melhor. Pretendo abordar outros gêneros mais adiante, mas ainda há muita história de malassombro pra contar. Michael Ende já disse em A História Sem Fim que o País dos Espectros é um dos maiores e mais importantes da terra de Fantasia.

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Tem planos para novos livros?

Sim. Para muitos. Espero que jamais me falte uma boa história para contar.

Como vê a atual situação com a pandemia do Covid 19? O que espera das Nações?

Essa pandemia é um evento estarrecedor. Pouquíssimos dos que hoje vivem testemunhou algo semelhante. Temos tecnologia, temos recursos e somos impotentes. Sem união, sem equidade, o impacto será muito maior do que o imaginado. Essa crise mostra o quanto a sociedade é desigual e o quanto essa desigualdade é cruel e perigosa, o quanto nosso egoísmo pode custar, que uma arma carregada não mata um vírus nem cura uma doença nem gera emprego nem hospital nem nada do que é realmente importante, que o sucateamento da saúde pública é uma catástrofe, como também custou caro a falta de investimento em pesquisa científica nas universidades. Expôs uma série de mazelas que sempre foram evidentes, e ainda são, e ninguém queria enxergar. Será triste se passarmos por uma crise tão grande sem aprendermos as lições que estão sendo passadas ao custo de tanta dor e de tantas vidas.

O que diria aos novos talentos da literatura brasileira?

Um escritor precisa de duas coisas: uma boa história para contar e saber como contar uma história. Leiam muito, observem com atenção o mundo ao seu redor, pois a fantasia só é fantástica se comparada à realidade, e a realidade só é real se for honesta.

Abraço, meu querido!